sábado, 5 de setembro de 2015

8 dicas para não acabar com uma amizade

Gilmar P. da Silva SJ*

Fazer amigos é uma arte delicada. Às vezes nos vemos em um processo bonito de confiança e abertura quando, de repente, uma fala ou gesto trava os avanços conquistados na relação. Algumas coisas, portanto, precisam ser aclaradas para que a amizade se desenvolva mais fluidamente.

1. Quero expor meus sentimentos, não estou pedindo conselho – Com frequência nosso coração se atribula de emoções decorrentes das coisas nas quais estamos metidos. Numa tentativa de organizar isso para nós mesmos e objetivar os fatos, costumamos expor aos amigos o como estamos nos sentindo. Só queremos um ouvido, sentirmo-nos acolhidos e saber que não estamos sozinhos, não pedindo um conselho. Nem sempre você tem que dizer o que o outro deve fazer. Algumas dicas podem vir em forma de pergunta como “Você já tentou isso?” ou “E se você fizesse aquilo outro?”; outras vezes basta um abraço.

2. Você não sabe tudo de mim – Há coisas em nós que não nos damos conta e que os outros percebem. Em contrapartida, há coisas que sabemos de nós e que os outros não sabem, por mais que convivamos muito e que nos demos a conhecer em demasia. Cada pessoa é eterno mistério. Ouvir de alguém “Você é assim. Eu te conheço” é uma tremenda redução. Esse ou aquele modo é o como você percebe ou lê a vida da pessoa, não ela mesma. Há uma distância entre o que se concebe de alguém e o que ela é. Por isso é melhor dizer “Eu te percebo assim”, “Eu te sinto assim”. Não esgote ou reduza seu amigo à sua experiência dele.

3. Não sou seus outros amigos – “Sempre faço isso com meus amigos”, “Trato todo mundo desse jeito e ninguém nunca falou nada” – típico de quem não está vendo quem está diante de si. Não é porque você trata a maioria de suas amigas de “queridinha”, por exemplo, que sua nova amiga vai gostar. Talvez ela prefira ser chamada pelo nome. Não é porque seu amigo é homossexual que ele vai gostar ou queira ser tratado no feminino. Não é porque seu amigo seja grande que goste de ser tratado no aumentativo (“E aí, Marcão!”, “Oi, lindona!”). O princípio aqui não se refere somente ao modo de tratar oral, mas também vale para o conjunto de ações. Se você foi a uma festa ou lugar com alguém e foi super legal não implica que será com outra pessoa. Repetir situações com pessoas diferentes e querer que tudo saia igual pode significar que você não está fazendo distinção entre uma e outra, talvez esteja olhando para alguém e vendo nela um outro. Não seria melhor reconhecer a singularidade de cada um?

4. Por favor, sem comparações! – Quando se vai perceber que eu sou eu, você é você e o outro é o outro? “Ah! Eu já fiz isso. Porque você não pode fazer?”. Simples. Porque as pessoas são diferentes, os sentimentos são diferentes, os modos de organizar são diferentes, as circunstâncias são diferentes. Talvez você tenha pouca necessidade de sono ou tenha um metabolismo mais acelerado, sei lá, e por isso consiga levantar mais cedo para fazer aquela caminhada. Bem, seu amigo pode não conseguir o mesmo e dar-se como exemplo não é motivador. Ao contrário, diz da não compreensão das circunstâncias existenciais do outro. Ah! E não espere que ele faça uma lista explicando os motivos de não conseguir realizar isso ou aquilo. Algumas circunstâncias pedem incentivo sim, mas comparações não costumam ser motivadoras. Como dizem muitas mães por aí, você não é todo mundo. Não é porque todo mundo faz alguma coisa que eu possa ou vá fazer. Por favor, não me compare (e nem ninguém).

5. Só para reforçar, eu não sou você – Essa coisa de só fazer algo se o amigo ou a amiga também fizer é bem imaturo. Amigos não precisam fazer tudo juntos e fazer chantagem emocional não é legal. Duas pessoas podem ser grandes amigos e terem gostos e opiniões diferentes. Ninguém tem que mudar de time ou ir a um jogo juntos. Há de se respeitar as individualidades. Amizade não é fusão de pessoas. Portanto, se não quero ir naquela balada que você adora talvez seja porque não suporto som alto e música eletrônica, não estou te rejeitando. E isso vale para concepções do mundo e ideias. Amigos discordam. Quando se diz que devemos tratar o outro como gostaríamos de ser tratados quer dizer que cada um precisa ser reconhecido em sua dignidade, não que vai gostar do que você gosta. Cada cabeça uma sentença, cada peito um sentimento, cada língua um gosto.

6. Porque não sou obrigado – Somos amigos e aprendemos a suportar as fraquezas e limitações um do outro, bem como compreender seus tempos maus. Tem dias que estamos um pouco mais ríspidos ou nervosos, o que é normal. Outra coisa é tratar a outrem com estupidez. Poder dizer qualquer coisa não implica em dizer de qualquer modo. Há coisas que são duras e que precisam ser ditas (e que vai doer de qualquer jeito), mas antes urgem serem passadas pelo filtro da caridade. Isso não é o mesmo que ser falso ou camuflar situações, trata-se de outra coisa. Você pode dizer “cala a boca” ou “desculpa-me, mas preciso um pouco de silêncio”; a gentileza é decorrência do respeito. E se por algum motivo falhou, pedir desculpas reaproxima. Ninguém é obrigado a ser maltratado.

Acrescente ainda que ninguém é obrigado a gostar de fumaça de cigarro, ouvir o som alto porque está de carona, a dançar porque a festa é na casa de quem convidou, a ficar perto do cachorro que segundo o dono é um fofo... Suportar algumas situações não é obrigação, pode ser esforço que se faz espontaneamente, não que se recebe por imposição. Atente para as gentilezas.

7. Posso mudar? – Os seres humanos são dinâmicos e em constante mutação. Aliás, os indivíduos evoluem no seu modo de pensar, comportar, perceber. Portanto, não espere que alguém goste das mesmas coisas ou faça tudo do mesmo jeito. “Mas você sempre fez isso!”. Pois é, mudei. Aliás, os processos de mudança geralmente são difíceis e demorados. Não será o amigo a pessoa a atrapalhar o crescimento de alguém. Permita que a pessoa seja ela mesma, o que pode passar pela mudança de hábitos ou de opiniões.

Frequentemente afastamentos de pessoas queridas acontecem pelo simples motivo de se obter liberdade para tomar rumos diferentes de vida. Quem assim procede não deixou de amar seus amigos, mas o fez desse modo para poder se desenvolver sem cobranças. Atualize sempre as configurações da percepção que tem do seu amigo. A versão que está diante de si não é a mesma do início da relação. Ficar preso à memória afetiva sobre alguém é negar o presente da pessoa.

8. Desculpa, mas preciso de espaço – Gosto tanto de você que às vezes preciso ficar sozinho. Pode parecer contraditório, mas a distância tomada constitui espaço de individualidade. Só existe relação quando existe alteridade, ou seja, só quando o outro é outro.

Faz parte de todo relacionamento tempos de distância e de silêncio. Cada qual pode ter interesses distintos que precisam ser cultivados. Não dá para ficar o tempo todo juntos. Além do mais, há momentos que a gente não quer ver ninguém. Então, porque um amigo tem que querer ver o outro sempre? No mais, há lugares que se gosta de ir com um e não com outro amigo, coisas que são legais de fazer com uma pessoa e não com outra. E não precisa que todos do meu campo de relação estabeleçam amizades entre si (e algumas vezes isso nem dá certo). Por isso surge também a necessidade de espaço. Você é meu amigo, mas não o único. Tudo bem que se goste de alguém, mas o cuidado excessivo e a presença ininterrupta podem ser asfixiantes e você não vai querer sufocar ninguém de tanto amor, né?!

Apesar de todos os atropelos que existe em uma relação, importa dizer: é bom ter amigos!
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*  Mestrado em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, com pesquisa em Signo e Significação nas Mídias, Cultura e Ambientes Midiáticos. Graduação em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Possui Graduação em Filosofia (Bacharelado e Licenciatura) pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. Experiência na área de Filosofia, com ênfase na filosofia kierkegaardiana. 
Fonte:  http://www.domtotal.com/agenda/dicas.php?artId=5354
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