quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Teólogos alemães propõem uma nova compreensão sobre o sexo

 
Dois grupos de notáveis teólogos alemães mostraram, sem rodeios, como a doutrina da Igreja está alinhada com as preocupações ou estilos de vida da maioria dos católicos europeus ao responderem a um questionário do Vaticano sobre as atitudes dos fiéis relativos a questões como uso de métodos contraceptivos e casamento homoafetivo.

Os ensinos sobre o sexo por parte da Igreja, dizem os representantes da Associação dos Teólogos Morais Alemães e da Conferência dos Teólogos Pastorais de Língua Alemã, vêm de uma “realidade idealizada” e precisam de uma “avaliação nova e em seus fundamentos”.

“Torna-se dolorosamente óbvio que o ensino moral cristão, que limita a sexualidade ao contexto do casamento, não possa olhar de perto o suficiente os muitas formas de sexualidade fora do casamento”, dizem os 17 signatários da resposta ao questionário proposto em preparação para o Sínodo sobre a Família, onde se encontram alguns dos mais respeitados acadêmicos católicos da Alemanha.

Os teólogos propõem também que a Igreja adote um paradigma inteiramente novo para seus ensinos sobre o sexo, com base não em avaliações morais dos atos sexuais individuais, mas sim na fragilidade do casamento e na vulnerabilidade que as pessoas vivenciam em sua sexualidade.

Os teólogos estão respondendo a um pedido do Vaticano, feito em de outubro passado, para que os bispos de todo o mundo se preparem visando um encontro global, a ocorrer este ano, dos prelados católicos. O Vaticano distribuiu um questionário com tópicos sobre a família para ser divulgado “tão amplamente quanto possível nos decanatos e paróquias, de forma que as contribuições de fontes locais possam ser recebidas”.

O Papa Francisco anunciou o encontro dos bispos, conhecido como Sínodo, para o dia 05-10-2014. O encontro irá estar centrado sobre os “desafios pastorais para a família no contexto da evangelização”.

O questionário, enviado do escritório do Vaticano para o Sínodo dos Bispos, pede às conferências dos bispos para questionarem suas populações sobre assuntos que têm dividido, de modo notável, a Igreja, tais como o ensino católico que proíbe o uso de métodos contraceptivos artificiais e a possibilidade de um católico divorciado se casar novamente ou de receber a Comunhão.

A análise do questionário feita pelos teólogos alemães vem em meio a uma disputa permanente entre os líder da Conferência Episcopal da Alemanha, Dom Robert Zollitsch, e o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o recém-nomeado cardeal Gerhard Müller, sobre a forma como a Igreja deveria tratar a questão dos católicos divorciados.

No ano passado, os alemães anunciaram um plano para permitir católicos divorciados a fazerem uma “decisão responsável em consciência” para participar nos sacramentos depois de consultar um padre. Dom Müller repreendeu o plano no mês de outubro num artigo de 4600 palavras publicado no jornal quase oficial do Vaticano, o “L’Osservatore Romano”, dizendo que a “economia sacramental inteira” não poderia ser posta de lado por um “apelo à misericórdia” sobre o assunto.

Na segunda-feira, os teólogos enviaram ao site National Catholic Reporter uma tradução em inglês do documento preparado por eles, originalmente publicado em alemão no final do ano passado.

Inicialmente, os teólogos respondem a quase todas as perguntas do questionário, apontando como ou por que motivo o ensino da Igreja não é seguido às vezes.

Por exemplo, em resposta a uma pergunta relativa aos ensinos da Igreja quanto ao valor da família, respondem que a doutrina da Igreja é “praticamente não aceita” e que “frequentemente carece na relação com a experiência”.

Continuando neste assunto, os teólogos também afirmam que as pessoas “não se satisfazem quando a Igreja propõe apenas o celibato e o matrimônio como formas legítimas de viver”.

“À luz do Evangelho, a questão que se deve examinar é se as outras formas de viver poderão ser destituídas do veredicto do pecado”, afirmam.

Já em resposta às perguntas sobre se os católicos que se divorciam compreendem o processo da Igreja de anulações, eles escrevem que, para a maioria das pessoas divorciadas, o processo é “irrelevante”.
“Para a maior parte das pessoas em questão, a declaração de anulação do casamento é irrelevante porque elas não percebem a nulidade de seu casamento, em lugar disso percebem o seu fracasso, e porque anseiam uma vida apesar deste fracasso”, eles afirmam.

“Portanto, a prática canônica da Igreja, quanto ao matrimônio, não substitui as próprias respostas a situações nas quais uma perspectiva de esperança se abre na forma de um novo parceiro ou parceira após o fracasso de um casamento vivido seriamente”.

Ao responder a perguntas sobre a proibição da Igreja de métodos contraceptivos artificiais, os teólogos afirmam que “mesmo os católicos mais comprometidos não percebem o uso que fazem destes métodos como conflitantes com seu envolvimento na Igreja, o que poderia levar a mudanças em suas práticas sacramentais”.

Na proposta em que apresentam um novo paradigma de avaliação dos atos sexuais, os teólogos dizem que a Igreja precisa apreciar a nudez e a vulnerabilidade que o indivíduo vivencia sem sua vida sexual.

Escrevem que tal paradigma teria três dimensões pelo menos:

– Uma dimensão do cuidado para “proteger o que é frágil”. Os teólogos afirmam que o casamento “poderia então ser compreendido como uma instituição que projete esta fragilidade, não como uma instituição de obrigação”.

– Uma dimensão emancipatória que “abra perspectivas novas quando a vulnerabilidade se tornou violação” (...) “Como uma ética emancipatória, a ética cristã sexual precisa ficar do lado daquele que perde no relacionamento, precisa estar ao lado daquele que é deixado e que sente a dor no ponto mais profundo de seu coração”.

– E uma dimensão reflexiva que “aceite a vulnerabilidade e contrarie a banalização e rotinização da sexualidade” (…) Como uma ética reflexiva da vulnerabilidade, a ética sexual cristã sabe do valor ontológico da vulnerabilidade”, afirmam. “A alegria da intimidade pode ser vivenciada apenas quando ela é passível de ser vulnerável sem estar sendo violada”.

Entre os teólogos que assinam o manifesto estão Antonio Autiero, professor emérito na Universidade de Munster; Karl-Wilhelm Merks, professor emérito na Universidade de Tilburgo; e Eberhard Schockenhoff, professor na Universidade de Friburgo, na Alemanha.
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A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 14-01-2014. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Fonte: IHU online, 15/01/2014
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