terça-feira, 12 de novembro de 2013

A mãe que não temos

 Paulo Sant'Ana* 
 
Fui, em um dia da semana passada, ao velório da senhora Vera Grabauska, mãe do colega Cléber Grabauska.

Sempre que posso, compareço ao enterro de mães de meus amigos ou colegas. É uma forma de reparar o fato de que eu não pude comparecer ao enterro de minha mãe, Nair Neves Sant’Ana, pois eu tinha apenas dois anos de idade.

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Não faço ideia de como era minha mãe. Com certeza, carregava-me no colo, tanto que tenho uma grande cicatriz na mão esquerda, dizem que ela me sobraçava quando botei a mão no ferro elétrico fervente com que ela passava roupas. Sabem como são as mães dos pobres, não podem contratar babás para cuidar de seus bebês.

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Como ainda sonho, numa agonia, que tivesse podido conhecer minha mãe. Como eu gostaria de ter conversado com ela, de ter sabido de suas aflições e prazeres, como eu quereria beijá-la nos intervalos de suas lidas, como eu queria ser, adulto, estreitado por ela em seus braços.

Mas não pude, eu tinha apenas dois anos de idade quando ela faleceu, morreu de pneumonia num tempo (1941) em que não tínhamos acesso à penicilina.

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E minha mãe tão cheia assim daqueles carinhos com que guardava minhas roupinhas!

E minha mãe me acalentando para chegar ao meu futuro, eu com dois anos de idade, e meu irmão Cirilo, um bebê de alguns meses.

E meu pai no trabalho e ela cuidando de nós dois. Dando de mamar, botando papinha na minha boca.

Olho para a foto dela e reluzem seus olhos grandes. Ah, minha mãe, quanto me fizeste e ainda me fazes falta na vida. Eu teria sido outro se não tivesses morrido. Eu teria sido mais seguro e menos infeliz nas minhas tonturas.

Se tivesses tido tempo para ser minha mãe completa, é certo que eu seria feliz e não teria por que me lamentar da existência.

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Meu pai deve ter ficado atônito quando minha mãe morreu. Que iria fazer ele com seus dois filhos tenros, um ainda bebê?

Entregar-nos-ia para nossas tias, Nila e Lita, irmãs dele que eram ainda solteiras?

E o que seria de nós sem mãe nos anos futuros? Certamente, não daríamos certo, como não demos.

Não guardo nenhuma lembrança de minha mãe. Não sei como era sua voz e não me lembro dos beijos que ela certamente me dava.

Ah, minha mãe, nem uma vaga lembrança de ti me resta.

Se existe céu, como creem os crentes, é lá que me encontrarei contigo ao lado do Senhor.

E que festa a do nosso reencontro, minha mãe querida, que festa!

Os céus retumbarão quando me revires!
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* Jornalista.  Colunista da ZH
Fonte: ZH on line, 12/11/2013
Imagem da Internet

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