terça-feira, 30 de julho de 2013

Receita de mãe

Carlos Heitor Cony*
 

Muito boa, antológica, a entrevista que o papa Francisco concedeu ao Gerson Camarotti, merecedora de um prêmio especial por vários motivos, pelo entrevistado e pelo entrevistador. 

Há 2.000 anos, são raríssimas as entrevistas pessoais com os chefes da Igreja Católica. Não havia veículos de transmissão e, quando surgiram jornais, revistas, rádio e TV, continuaram raríssimas. Para falar a verdade, só me lembro de três. 

Viajei com João Paulo 2º duas vezes. Bati papo com ele, mas não foi uma entrevista. Ele contou que havia aprendido a dizer em português "aquele abraço". Perguntou se colava mal repetir a saudação em seus pronunciamentos oficiais. Não me deu conselho al-gum, mas o pediu a um pecador, agnóstico profissional. 

Papa Francisco respondeu com sinceridade e coragem a todas as perguntas do Gerson. Na edição da entrevista, houve inserções dos seus pronunciamentos públicos, inclusive o que me pareceu mais veemente, quando exigiu que os jovens continuassem a protestar em todo o mundo contra uma sociedade injusta e violenta. Chegou a dizer, em público e na entrevista pessoal, que o jovem calado não é do seu agrado. 

Reconheceu os pecados da igreja, ele próprio se admitiu pecador. Não será fácil reformar a Cúria Romana, poderá até se tornar trágico --já houve precedentes ao longo da história. 

A sua primeira visita internacional foi mais do que um sucesso. Ele chegou a pedir desculpa ao prefeito do Rio pela "bagunça" que provocou na cidade. A culpa não foi dele, mas das autoridades locais, que se mostraram incompetentes para enfrentar um even- to de nível mundial. 

A palavra que Francisco mais falou na entrevista foi "proximidade". A mãe que segura o filho no colo e fala com ele no peito, e não por meio de cartas e homilias. Valeu. 
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* Jornalista. Escritor. Colunista da Folha
Fonte: Folha on line, 30/07/2013
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