sexta-feira, 31 de maio de 2013

‘Má imagem do Banco do Vaticano prejudica mensagem do Papa’

Aos 52 anos, Ernst von Freyberg garante ter encontrado transparência e cooperação nos bastidores do Banco do Vaticano Foto: Elisabetta Piqué / La Nación

Aos 52 anos, Ernst von Freyberg garante ter encontrado transparência e cooperação nos bastidores do Banco do Vaticano Elisabetta Piqué / La Nación 

Ernst von Freyberg, novo presidente do Instituto para Obras de Religião, defende política de tolerância zero diante de irregularidades O empresário descarta os rumores de que o Papa Francisco tenha interesse em fechar a instituição financeira Sua principal missão é limpar a imagem do IOR, onde suspeitou-se que até Osama bin Laden tinha uma conta

ROMA — O novo presidente do Instituto para Obras de Religião (IOR), Ernst von Freyberg, tem pela frente um desafio gigantesco: limpar a imagem do chamado Banco do Vaticano. Ele é o sucessor de Ettore Gotti Tedeschi, o banqueiro do Opus Dei, afastado em meio a um escândalo no ano passado.
Freyberg contratou uma empresa americana de auditoria contra as denúncias de lavagem de dinheiro na instituição. E para provar que uma nova era, de transparência, começa na contestada instituição, esse empresário e advogado alemão, de 52 anos, abriu pela primeira vez as portas de seu escritório ao jornal argentino “La Nación” — integrante do Grupo de Diários América (GDA), do qual O GLOBO faz parte.

Por que o IOR tem uma imagem tão ruim e o que fará para revertê-la?
Essa é a única pergunta importante, um tema essencial. Meu objetivo principal é acabar com essa má imagem que fere a mensagem do Papa ao mundo. Na minha análise, um triângulo criou essa imagem negativa: o primeiro lado é que muitas coisas no passado não deveriam ter ocorrido, e menciono apenas o Banco Ambrosiano. O segundo, o IOR está sujeito a uma interminável sequência de rumores e calúnias que são apenas fantasmas. O terceiro lado do triângulo é que o IOR nunca se comunicou. Alguém que não se comunica está também mandando uma mensagem.

O que fará para reverter isso?
Para começar, aplicar uma política de tolerância zero diante de qualquer irregularidade. Eu contratei os melhores consultores do mundo, peritos em políticas de combate à lavagem de dinheiro, do Promontory, dos Estados Unidos, para revisar todas as contas que temos, uma a uma. E para revisar nossas estruturas e procedimentos de forma a cumprir com os máximos padrões internacionais contra a lavagem de dinheiro.

Mas houve lavagem de dinheiro?
Não sei quanto ao passado muito distante. Mas hoje não tenho indicações de que se tenha lavado dinheiro. Se eu detectar um caso, vou agir sem piedade.

Não existem contas ocultas ou anônimas, como se denunciou?
Agora vamos à segunda parte do triângulo, a que não diz respeito a feitos, mas a fantasmas. Um deles é o de que há contas ocultas. Mas não há, é contra a lei e desde 1996 é impossível tê-las em nosso sistema. Há pelo menos 15 anos, não há contas ocultas aqui e não sei se havia antes.

O presidente anterior do IOR, Ettore Gotti Tedeschi, depois de ser demitido no ano passado, alegou que temia ser assassinado, que havia contas ocultas e que, quando pediu informações sobre elas, teve acesso negado. Ele acusou o vice-presidente Paolo Cipriani de ocultar dados. Isso é um fantasma?
Nunca conheci Tedeschi e não posso falar da experiência dele. A minha experiência é a de que o instituto é muito cooperativo, que Cipriani é muito cooperativo. Uma das primeiras coisas que fiz foi verificar todos os nomes ligados a nós. Eu mesmo sentei com Cipriani e o vice-diretor na frente do computador e olhei todos os nomes impróprios, se tinham alguma conta aqui. Nenhum tem.

Não saíram à luz os nomes de mafiosos e criminosos?
Sim. Lendo os jornais, diziam que Osama bin Laden tinha conta com a gente: fui ao sistema e pesquisei se tínhamos um Osama, ou um Bin ou um Laden. Tampouco encontrei Toto Riina (um mafioso do grupo Cosa Nostra) ou gente da Magliana (grupo criminoso que atuava em Roma entre os anos 1970 e 1980). Não só não encontrei esse tipo de nomes como também tive a maior cooperação da administração. Encontrei transparência. Agora, como presidente, não posso controlar as 19 mil contas e, por isso, contratei a Promontory, que é numero um no mundo na luta contra a lavagem.

Então o plano básico é limpar a imagem do IOR...
O plano tem dois elementos essenciais: limpar a imagem e limpar nossas contas, o que significa controlar se há contas impróprias. No momento, não temos indicações disso. Quanto à imagem, é preciso ser transparente e conversar, começando por falar com nossos funcionários, com a Igreja, com os cardeais, com a Cúria, e por fim, com cada um dos católicos do mundo. Nossa reputação incide na mensagem da Igreja em todo o mundo.

Muitos acham que o Papa poderia determinar o fim do IOR ou transformá-lo em um banco ético...
Eu estou aqui para servir ao Papa e para que o IOR seja uma instituição bem administrada, de boa reputação. O Papa decidirá o que quiser, mas eu não quero que o IOR seja um problema para ele.

O fechamento poderia ser possível ou é apenas um rumor?
É só um rumor. É um dos tantos fantasmas que nos rondam, e eu prefiro os fatos. Os fatos são que eu tenho a tarefa de gerenciar o IOR com os mais altos padrões de ética internacional, e o Papa deve decidir se vai mudar a missão. O que é certo é que os nossos 19 mil clientes precisam do serviço. E por falar em transparência e reputação, vamos publicar um relatório anual, incluindo o ano de 2012, e também as contas auditadas. Além disso, vamos abrir no dia 1º de outubro um site onde poderá ser feito via internet o download do relatório anual com a situação financeira.

O senhor se reuniu e discutiu tudo isso com o Papa?
Não. Tenho o privilégio de ficar também na Residência de Santa Marta e, uma vez, depois da missa da manhã, pude saudá-lo brevemente.

Então, nunca falou com ele da reforma do IOR...
Não. Estou aqui para servi-lo, acho que o Papa tem coisas mais importantes a fazer e, reitero, meu trabalho é que ele não tenha problemas com o IOR.
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