quinta-feira, 14 de março de 2013

Segue a recusa à contaminação marxista e à secularização

LUIZ FELIPE PONDÉ*
 
 
A IGREJA PISA FORA DA EUROPA, MAS MANTÉM A RECUSA À TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO, À ESQUERDA PASTORAL LATINO-AMERICANA 

A igreja deu mais uma prova de sua sabedoria histórica ao escolher Jorge Mario Bergoglio para ser o papa. Ela diz sim aos anseios de um papado não alienado dentro dos muros de uma Europa voltada para si, mas ao mesmo tempo manteve o curso da revolução conservadora de Ratzinger.

Ela significa a recusa à contaminação marxista e o expurgo de um clero mais afeito às demandas de uma sociedade secularizada.

Já na escolha do seu nome, o novo papa indica sua aproximação com um personagem dentro da história da Igreja. São Francisco (séculos 12 e 13) é conhecido como sendo um "consenso" como santo e como pessoa.

Doce e carismático, mas forte em suas convicções, são Francisco surgiu quando a sociedade medieval marchava para a urbanização e, portanto, precisava de ordens menos rurais, mais abertas ao movimento social das cidades emergentes.

Homem egresso da burguesia italiana medieval, são Francisco recusa a riqueza de seu pai e será identificado como um duro adversário das impurezas da Igreja em sua época (vida sexual indevida e intrigas palacianas). Ele também é lembrado como um defensor da pobreza da igreja (o próprio Bergoglio é conhecido por recusar luxos materiais dispensados aos arcebispos e cardeais) e do respeito a toda forma de vida.

Com Bergoglio, a igreja dá um passo fora do mundo europeu rico, mas ao mesmo tempo se mantém fiel à recusa da Teologia da Libertação, à esquerda da pastoral católica latino-americana. A igreja argentina foi bem impermeável à contaminação política marxista, algo que não aconteceu no Brasil, na Colômbia ou América Central.

Durante a ditadura argentina, Bergoglio nunca foi visto como simpático aos grupos de esquerda, o que lhe custou algumas antipatias.

A ordem jesuíta, da qual ele faz parte, sempre foi identificada com modos "agressivos" de aprendizagem da cultura do "outro" para fins catequéticos. Jesuítas são vistos por muitos como os "modernos da igreja". No Oriente, chegaram a pintar Jesus com feições orientais. Ao mesmo tempo, juram fidelidade absoluta ao magistério católico e ao papa. Uma imagem de equilíbrio entre o novo e a tradição.

Outra referencia a um santo de nome Francisco importante é vista justamente em são Francisco Xavier (século 16), grande catequizador do Oriente, conhecido como o jesuíta que teria convertido mais não cristãos ao cristianismo.

O novo papa é um homem identificado com o combate aos excessos da sociedade de mercado, ao lucro desmesurado. Advoga a defesa dos pobres, mas em um espírito bíblico e não político-partidário, opção metodológica cara ao teólogo Ratzinger desde os anos 1980. E o que significa isso?

O cristianismo nasce da corrente profética hebraica marcada pela "crítica social" ao mundo do poder na antiguidade semítica.

Assim, os profetas denunciaram o acúmulo de riquezas e a indiferença dos poderosos com o sofrimento do mais pobres, dizendo que o Deus de Israel quer que as pessoas se ocupem das viúvas, dos órfãos e dos pobres, em vez de tentarem "comprar" favores de Deus via sacrifícios no templo.

Na figura carismática de Bergoglio, a igreja marca mais um ponto no combate à teologia da libertação, ao mesmo tempo em que se mostra sensível ao apelo da maioria não europeia de seus fiéis -e também permanece fiel à imagem de um cristianismo ao lado dos que sofrem. 
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* Colunista da Folha
Fonte: Folha on line, 14/03/2013
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