quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Poesia e cerveja

 Martha Medeiros*
 
Inspirada pelos ares que sopram da Praça da Alfândega, lembrei de um e-mail que recebi. Um rapaz contou que estava num churrasco com amigos quando acabou a cerveja. Foi escalado para ir ao supermercado buscar mais. Meia hora depois, retornou sem nenhuma latinha, mas com um livro de poemas meu. “Fui quase linchado.” Pô, trocar cerveja por poesia, até eu lhe daria uns beliscões.

Mas não posso negar que fiquei toda boba por meus versos terem seduzido um garoto de 20 anos em plena sexta à noite num corredor do Zaffari. Na verdade, não sei se ele tinha 20 anos, se era uma sexta e se foi no Zaffari, mas não resisti em formatar aqui um cenário mais completo. A cena é boa demais para ficar sem detalhes.

Aproveitando a Feira, uma dica: abrace os poetas. A começar pelo nosso patrono, Luiz Coronel, e mais Ferreira Gullar, Alice Ruiz, Antonio Cícero, Fabrício Carpinejar, Adélia Prado, Armindo Trevisan, Celso Gutfreind, Elisa Lucinda, Affonso Romano de Sant’Ana, Thiago de Mello, Viviane Mosé, todos em atividade. Não, Stella Artois não é uma poeta. Querendo prestigiar um talento novo, anote: Gatos Bravos Morrem pelo Chute, do gaúcho Tiago Ferrari.

Afora a poesia, selecionei 11 títulos entre os muitos que li este ano, entre romances, crônicas e ensaios:

Por Favor, Cuide da Mamãe, de Kyung-Sook Chin. Os segredos e sentimentos de uma família sul-coreana, numa história universal e belamente escrita.

O Caderno de Maya, de Isabel Allende. A autora escreveu uma história contemporânea e impressionante, inspirada na barra-pesada vivida por seus enteados.

Sunset Park, de Paul Auster. Após um acidente familiar ocorrido na adolescência, um garoto procura colar seus cacos junto a outros desgarrados que moram em uma casa abandonada. Excelente.

A Borra do Café, de Mario Benedetti. Relançamento de uma de suas obras mais tocantes. O autor uruguaio mescla memória e invenção ao narrar sua infância em Montevidéu.

Resposta Certa, de David Nicholls. Diálogos ótimos, do mesmo autor de Um Dia. O título poderia ser Diversão Certa.

Tempo é Dinheiro, de Lionel Shriver. Suicídio, câncer terminal, mortalidade, humor negro. Só mesmo a autora de Precisamos Falar sobre Kevin para transitar sobre esses assuntos sem nenhuma condescendência e arrebatar o leitor.

A Vida Gritando nos Cantos, de Caio Fernando Abreu. Crônicas publicadas no jornal O Estado de S. Paulo entre 1986 e 1996. O mesmo texto charmoso e provocativo que deixa saudade até hoje.

A Queda, de Diogo Mainardi. Impossível ficar indiferente. A secura convivendo com a docilidade de uma forma única e emocionante.

Como Ficar Sozinho, de Jonathan Franzen. Do mesmo autor do aclamado Liberdade. Ensaios sobre a solidão, a nicotina, a literatura, a invasão de privacidade e outros temas que ganham uma nova perspectiva sob o olhar astuto desse mestre da prosa.

Alta Ajuda, de Francisco Bosco. Ensaios de um jovem filósofo que tem o talento no DNA. Filho do músico João Bosco, é articulista do jornal O Globo, no qual escreve sobre cinema, futebol, amizade, sexo, política.

Pequenos Contos para Começar o Dia, de Leonardo Sakamoto. Breve e belo, até parece livro de poesia – olha ela, de novo. Uma palhinha: “Os professores de matemática dizem que a menor distância entre dois pontos é uma reta. Menos pro meu avô: ‘Besteira! A menor distância é aquela em que a gente se diverte mais’”.
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* Escritora. Cronista da ZH
Fonte: ZH on line, 31/10/2012
Imagem da Interent

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