terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Raghuran Rajan - Entrevista

Brasil e China estão à beira do superaquecimento,
diz Raghuran
A União Europeia poderá ter de injetar mais capital nos bancos, no entender de Raghuran Rajan, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional e professor de finanças da Universidade de Chicago Booth School of Business. Na hipótese de reestruturação da dívida pública de países membros maiores, como a Espanha, por exemplo, alguma perda seria imposta também ao setor privado. "O setor público sozinho não daria conta de toda a injeção de recursos necessária", diz.
Mas os bancos, ainda fragilizados por uma das maiores crises financeiras da história, não teriam como absorver todo o choque, que seria também distribuído para os detentores de títulos da dívida. "É óbvio que a situação política não favorece essa nova capitalização dos bancos", avalia. "A popularidade das instituições financeiras está em baixa depois da crise."
Segundo Rajan, a União Europeia resolveu adiar o debate para 2013, pois o que se espera é que até lá os bancos estejam melhor capitalizados e mais dinheiro público não seja necessário para eles. "Mas, enquanto espera, o setor privado está vendendo e o setor público está tomando essa dívida cada vez mais", disse ele.
Após sua palestra na Conferência de Risco País 2011 da Coface, no Carrousel du Louvre, em Paris, ele falou ao Valor:

Valor: O que o senhor acha das medidas cambiais recentes adotadas pelo Brasil?
Raghuran Rajan : Assim os políticos parecem estar fazendo alguma coisa. Você tem muito fluxo de capital, você tem a sua moeda se apreciando, e na verdade eles não têm muito o que fazer, pois os controles de capitais nem sempre funcionam, há sempre muitos vazamentos. Os países emergentes, como o Brasil e a China, estão crescendo mais e atraem moeda por causa disso. E vão se tornando aos poucos os principais compradores dos produtos dos países desenvolvidos. A China deveria deixar sua moeda valorizar, pois há riscos.

Valor: Quais são?
Rajan : Aumento da inflação e criação de uma bolha especulativa nos mercados emergentes. Se países como o Brasil e a China não aproveitarem de forma adequada esse fluxo de recursos todo, correm o risco de promover um superaquecimento da economia. O Brasil e a China hoje estão à beira do superaquecimento.

Valor: Quais os sinais no Brasil?
Rajan: O desemprego está em recorde de baixa e a inflação subindo. Os países emergentes têm de deixar suas moedas apreciarem, o que ajuda a segurar a inflação, reduzir juros para atrair menos capital especulativo e fazer um aperto fiscal e no crédito ao mesmo tempo para evitar esse superaquecimento econômico. Tem de ser tudo combinado.

Valor: O relaxamento quantitativo do Fed ajudou a apreciar as moedas dos emergentes?
Rajan: Eu não concordo com o segundo relaxamento quantitativo. Não acho que foi realmente necessário. Logo depois do anúncio, os Estados Unidos voltaram a crescer. Você deve comprar dívida pública quando o governo está com déficit crescente e o país cresce? Faz sentido? Não me parece. Você não pode forçar o crescimento no emprego por meio da política monetária. O desemprego nos EUA tem um componente estrutural, de mão de obra não qualificada que era usada na construção civil e que terá dificuldade para se recolocar. Mas o principal efeito no mercado de moedas foi os investidores comprarem dólar, na fuga do risco por causa da crise na Europa.

Valor: O senhor acredita na necessidade de reestruturação na Europa, até da Espanha?
Rajan: Eu espero que a Espanha não seja tão afetada como Irlanda, Grécia ou Portugal.

Valor: O senhor acredita que a Espanha não será afetada?
Rajan: Eu espero, apenas espero. Por enquanto, o que se fala mais é na necessidade de reestruturação na Grécia. Se ela reestruturar, você poderia ter juros subsidiados com vencimentos alongados e isso poderia ajudar. Eles vão tentar mascarar a reestruturação. Mesmo reestruturando, será difícil colocar a Grécia nos trilhos. Mas será possível, pois com juros mais baixos você pode estabilizar a dívida. O setor público não pode aguentar sozinho se a crise espalhar para a Espanha. Haveria alguma perda para o setor privado e daí sim precisaria recapitalizar os bancos.
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De Paris

Fonte: Valor Econômico online, 18/01/2011
Imagem da Internet

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