quinta-feira, 27 de maio de 2010

A destruição de árvores

MÁRCIA H. CORRÊA E ROSELI B. TORRES*

Uma das previsões dos cientistas do Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas é a de que o aumento da temperatura do planeta levará à ocorrência cada vez mais frequente de chuvas fortes, tempestades e inundações, dentre outros eventos extremos. Nas áreas urbanas, a ocupação desordenada do solo e a sua impermeabilização têm como consequência o aumento da temperatura ambiente. As cidades atuais, onde se concentra a maior parte da população, são ilhas de calor, cuja temperatura ambiente é mais alta do que nas periferias. A existência dessa “bolha” de calor faz com que as tempestades sobre as cidades sejam fortes e violentas, alimentando o ciclo de destruição — enchentes, erosão, perdas materiais e humanas.

Ainda assim, o Departamento de Parques e Jardins (DPJ) de nossa cidade continua ad nauseaum com uma política de destruição das árvores urbanas. Elas têm sido mutiladas, extraídas e mortas sem justificativa técnica, embora existam em nossa cidade conhecimentos acumulados, especialistas em paisagismo, botânica e arborização urbana, e mesmo um guia de arborização urbana (GAUC) disponível para consulta pública no sítio da Prefeitura Municipal de Campinas. Árvores belíssimas e antigos retratos de um plantio diversificado e rico tombam para atender necessidades injustificáveis diante do quadro de degradação ambiental em que vivemos.

Então, qual a explicação para a contínua ação predatória do Departamento de Parques e Jardins ou com a sua expressa autorização? Por que a lei de arborização urbana — Lei nº 11.571, de 17 de junho de 2003 — é reiterada e sistematicamente desrespeitada? Por que os repetidos protestos da população em relação aos maus tratos às árvores da cidade não surtem qualquer efeito prático? Por que, apesar dos protestos de vários conselheiros em reuniões públicas do Comdema, o DPJ continua a autorizar e a efetuar podas e extrações das árvores da cidade sem critério técnico? Por que o Ministério Público, tantas vezes acionado, não se manifesta? Porque tudo é feito sem considerar que nossas perdas ambientais são para sempre e desencadeiam efeitos em cascata, e somos todos atingidos?

Campinas deve proporcionar uma vida de alta qualidade para seus habitantes, já que se coloca entre os maiores PIBs do país. No entanto, a criação de novas praças e de áreas verdes para o lazer e a recreação não é considerada no planejamento e nas discussões dos planos diretores e das macrozonas. Essas áreas verdes desempenham importante papel no equilíbrio psíquico da população e contribuem para a qualidade de vida de todos. As árvores (já cansamos de falar sobre isso) tornam o clima mais ameno, pois as plantas interceptam parte da radiação solar; aumentam a umidade relativa do ar devido à transpiração das folhas; contribuem para a diminuição das enchentes, pois as copas funcionam como anteparo para as chuvas, diminuindo o volume e a velocidade do escoamento superficial; amortecem os ruídos; controlam os ventos; funcionam como filtros das partículas sólidas em suspensão no ar; seus frutos e flores atraem e mantêm as mais variadas espécies de animais, tornando o ambiente urbano mais agradável, e podem contribuir para a conservação da biodiversidade regional.

A arborização planejada e bem cuidada ajuda a conservar o asfalto das ruas, representa economia para os cofres públicos. E também ajuda os moradores a economizar energia para a refrigeração dos ambientes fechados. Além destes benefícios diretos e mensuráveis, a arborização tem o valor estético e cultural — muitas árvores antigas da nossa cidade são marcos históricos para os moradores. Atualmente, temos menos de 3% de vegetação nativa no município — essa constatação nos leva a deduzir que deveríamos estar multiplicando as espécies nativas, estudando a sua biologia e, com planejamento e informação, plantando-as pelas nossas ruas e áreas verdes. Assim, a pergunta persiste — por que o poder público, que tem a obrigação de zelar pelas árvores da cidade, executa e ou autoriza essa política de destruição contínua do patrimônio ambiental urbano?
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*Márcia H. Corrêa é presidente da Associação Protetora da Diversidade das Espécies — Proesp; Roseli B. Torres é bióloga, botânica e vice-presidente da Proesp.
Fonte: Correio Popular online, 27/05/2010

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