quarta-feira, 7 de abril de 2010

Escola, ética, cyberbullying

Roberto Romano*
Pessoas me endereçam questões sobre vários pontos da vida ética no plano educacional. A última consulta que recebi dizia respeito ao cyberbullying. Como o trote cometido contra os calouros, aquele crime recebe a complacência de muitos dirigentes escolares e universitários. Ambos são fenômeno de massa, com a covardia inerente a semelhantes manifestações. É claro que a repressão, no caso, é insuficiente, embora necessária e urgente. O Ministério Público e a polícia não bastam para atenuar os efeitos e as causas de práticas abjetas, mascaradas sob o riso das jovens hienas, as quais se imaginam leões em seus bandos.

Um leitor enviou as seguintes perguntas, que cito integralmente: “Deve a escola permanecer alheia ao que se escreve em redes sociais — MSN, Orkut, Formsprings, Facebook? De que forma ela deve agir na questão — orientação aos pais, alunos, com reuniões, comunicados? A escola é parte integrante de uma rede ética externa ou não? Se um jovem é vítima do “cyberbullying” e a escola alega não poder controlar a situação, o que deve ser pensado?”

É falta de compromisso ético da escola dizer que “nada pode ser feito por ela” em caso de molestamento direto, por carta comum ou internet. Como a família, ela é sujeito de direitos e deveres. Os jovens são postos sob sua responsabilidade, não só na sala de aula, biblioteca ou cantina. Do ponto de vista legal, diretores podem alegar que nada está previsto a seu respeito. Mas não falamos de uma repartição, apenas legalmente orientada! Os professores respondem pelo jovem que devem formar para o convívio civil. Se a escola abre mão do seu dever, então, a quem os pais deveriam se dirigir? A vigilância precisa ser permanente, sobretudo quando existem denúncias ou suspeitas de perseguição. Se forem criados turnos de vigilância (do qual podem participar os integrantes adultos da comunidade de ensino, mestres, pais, funcionários) o molestamento pode ser detectado no começo. Assim, com a colaboração de todos os pais, os que deveriam cuidar melhor de seus pimpolhos serão postos, antes que ocorra um fato policial ou judicial mais grave, diante de seu dever.

A escola, aliada à família, é elemento essencial da modelagem ética dos jovens e dos pais que não tiveram a referida formação ou, devido aos atropelos da vida, não a empregam no trato com os filhos. Um malefício educacional é a complacência ao modo de Summerhill e dos que seguem aquela diretriz. Muito cômodo fugir dos choques, quando os jovens exigem algo que a prudência desaconselha. O conflito, se assumido pelos adultos, incentiva a busca comum de soluções. Se ele for adiado, os adolescentes, com autoridade que não lhes cabe, decidem tudo, prejudicam a si mesmos e aos outros. Existem pais que levam tapas de filhos, deles recebem ordens, críticas, caçoadas, o que sanciona comportamentos éticos detestáveis, mas infelizmente “populares”. Uma fonte dos assédios é a covardia dos pais nas horas em que deveriam mostrar autorrespeito. Genitores que não se valorizam jamais ensinarão os filhos a prezar os outros. Tudo pode ocorrer num recreio ou nas baladas permitidas, como se a anuência paterna fosse obrigatória. “Eu quero, eu faço, você não manda em mim”, quando se trata de comportamentos que incluem riscos morais ou éticos, são ditados de um tirano, o mesmo tirano que irá destruir a vida de seus colegas, no cyberbullying. Diante de um delegado de polícia, ou do juiz, somem os “eu quero, eu faço”. Resta a humilhação ou a desgraça. Dos pais e dos filhos.

Se os professores ignoram que seus estudantes perseguem ou são perseguidos em pontos sensíveis (beleza, inteligência, sexualidade), não os levam ao respeito de sua própria pessoa e das outras. O cyberbullying é massificado, não livre, covarde. Cabe à escola, com a família, lutar contra o esmagamento dos jovens pela massa. E. Canetti (Massa e Poder), expõe tal comportamento cruel ao analisar as hordas de fuga e perseguição. A escola deve impedir que os jovens pensem como lobos; educá-los como individualidades humanas responsáveis.
_________________________________________________________
*Roberto Romano é professor de Ética e Filosofia Política na Unicamp
Fonte: Correio Popular online, 07/04/2010

Um comentário: