quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Eleições: Os temas de 2010


Marcos Coimbra*



Talvez sejamos mais capazes hoje de prever o que vai ocorrer no ano que vem. Só não devemos esquecer as lições de nossa história. Curta, ela é. Se a ignorarmos, fica menor ainda

A uma distância como esta em que estamos das próximas eleições, uma das perguntas mais frequentes é sobre seu conteúdo, sobre que assuntos ou temas deverão ser debatidos com destaque maior. Saúde? Emprego? Segurança? Meio ambiente?

Especialistas de todos os tipos são ouvidos e costumam reagir em função de suas áreas de concentração. Médicos e sanitaristas puxam a brasa para a saúde pública, onde as pesquisas mostram como estão os problemas que mais afligem a população. Quem entende de segurança sabe que, em muitas regiões do país, ela é a prioridade para a maioria dos eleitores. Economistas, empresários e sindicalistas tendem a convergir na opinião de que o tema do desenvolvimento deveria ser central. Não é preciso ser ecologista para imaginar que as questões ambientais serão mais debatidas que no passado.

Considerando que os problemas enfrentados pela população são conhecidos e que sabemos como ela os hierarquiza, não deveria ser difícil responder à pergunta. Afinal, eles não são muitos e nem as opções para equacioná-los, ilimitadas.

Nada mais ilusório, no entanto. Às vezes, algo que, um ano antes, parece um tema óbvio, mal entra na pauta da eleição, que é inversamente dominada por um assunto que nem imaginávamos que teria relevância. Quem antecipa respostas pode errar o alvo por muito. As últimas eleições são um bom exemplo disso. Nelas, as duas coisas aconteceram.

Na verdade, elas nos mostram mais que isso. Seus antecedentes nos ensinam a cautela que devemos ter quando achamos que sabemos tudo de um processo tão dinâmico quanto uma eleição presidencial. O panorama que tínhamos em novembro de 2005 não se confirmou em quase nada e, aos poucos, os fatos se encarregaram de desmentir o que parecia provável.

Um ano antes, Lula estava em segundo lugar nas pesquisas, lideradas, com certa folga, por Serra. Nos primeiros dias de dezembro, de acordo com o Datafolha, o então prefeito de São Paulo tinha 36% e Lula 29%. Em todas as pesquisas que foram feitas de outubro ao fim do ano, o quadro era parecido. No Planalto, muita gente achava que Lula nem deveria concorrer, deixando que o PT indicasse outro nome e assumindo o papel de magistrado na eleição.

O terceiro lugar era de Garotinho, sendo Rigotto o outro nome cogitado do PMDB. Cristovam Buarque era apenas uma hipótese para o PDT, pois tinha acabado de chegar lá. No principal cenário apresentado aos entrevistados nas pesquisas, certo mesmo acabou sendo o nome de Heloísa Helena.

Quanto ao conteúdo, havia uma convicção: a eleição seria dominada pelo tema da ética e da luta contra a corrupção. Depois de meses às voltas com o mensalão, todo mundo apostava que Lula não teria como fugir dele e que nenhum de seus adversários perderia a chance de atacá-lo onde mais sua imagem sangrava. Não era por outra razão que alguns dos amigos do presidente queriam poupá-lo.

Pois bem, veio a eleição e uma das coisas que menos se ouviu foi qualquer cobrança incisiva nesse plano. Lula atravessou quase incólume o período mais crítico (durante a propaganda eleitoral) e, se não fosse o assunto “dossiê”, assim permaneceria. Talvez influenciadas por uma leitura simplista do aforismo “quem bate, perde”, as oposições se proibiram de tocar no assunto em torno do qual parecia que cerrariam fileira.

Com isso, a campanha de Lula pôde se dar ao luxo de trazer para o primeiro plano um tema onde ninguém teria colocado suas fichas: as privatizações. Nada melhor que combater um fantasma que você próprio inventa, como aconteceu no segundo turno, em que Lula nadou de braçada e Alckmin cambaleou sem conseguir responder aos ataques.

Talvez tenham sido eleições atípicas e a diferença entre o que se imaginava um ano antes e o que aconteceu nas urnas tenha sido especialmente relevante. Talvez sejamos mais capazes hoje de prever o que vai ocorrer no ano que vem. Só não devemos esquecer as lições de nossa história. Curta, ela é. Se a ignorarmos, fica menor ainda
*Sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
marcoscoimbra.df@dabr.com.br
FONTE: Correio Braziliense online - 18/11/2009

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