sexta-feira, 20 de novembro de 2009

E a felicidade... na Toca


Plínio de Campos Whitaker*

Sempre me despertaram atenção esses fradinhos e freirinhas que transitam pelas ruas e praças, trajando hábito marrom, às vezes um tanto surrado, fazendo-me pensar, de imediato, na ímpar figura de Francisco de Assis. Inicialmente, seu visual não me agradava... por que andar assim? Para atrair olhares de comiseração em pessoas sensíveis? Com o passar do tempo, porém, questionamentos que eu me colocava a respeito desses jovens foram se convertendo em conclusões. Uma delas: se o intuito deles e delas é despertar, nos transeuntes apressados, reflexões sobre a efemeridade de coisas que hoje inspiram os padrões da sociedade, quase sempre vazios, sua presença já se justifica.

Persistia-me, no entanto, uma indagação intrigante: tão despretensiosos no vestir-se, pés no chão ou apenas protegidos com calçados muito simples, qual o motivo da contrastante alegria que os caracteriza, e de onde a paz que emana das fisionomias desses, em maioria, quase meninos e meninas e, em menor número, adultos? Propus-me observar-lhes as atitudes. Houve ocasiões em que os colhi acompanhando pessoas encontradas na multidão de excluídos que vagueiam por aí, carentes de emprego, de teto, de pão, de saúde, de amor... de tudo! Na verdade, impressionaram-me gestos de amizade que presenciei, mais que isso, de amor profundo, identificando os acompanhantes pobres aos acompanhados paupérrimos. Decididamente interessado em conhecê-los melhor, abordei-os aqui e ali, lançando-lhes ousadas perguntas, muito próprias de um curioso insaciável. Deles conheci nascidos tanto em lares exemplares quanto em famílias cheias de problemas; deles conheci provenientes de casas remediadas, umas, e de humílimas, outras; deles foi-me dado conhecer também que vivenciaram experiências amargas, tão comuns em ambientes juvenis de grandes centros. Unanimemente, todos confessaram que a vida conventual que levam lhes dá resposta ao anseio de paz que sempre alimentaram — nunca saciado — e à necessidade infrene de encontrar sentido e verdadeira alegria de viver.

Quis vê-los em casa, no cotidiano. Ali os achei, quer entretidos nos cuidados corriqueiros da casa de uma grande família, quer apressados em dialogar com pessoas que iam chegando à busca de algo. Em uma dependência da casa, onde me impressionei com o profundo silêncio reinante, vários jovens em atitude orante, como se estivessem — e todos asseguraram-me que, de fato, estavam — na presença de seu Deus e Senhor.

Comunidade diferente, soube que foi fundada, há quase doze anos, pelo ex-fervoroso torcedor de futebol, ex-ferramenteiro, ex-desenhista mecânico e, hoje, sacerdote, o Padre Roberto José Lettieri que, com seus filhos e suas filhas espirituais, adoram a Deus no Sacramento e, concretamente, O amam na pessoa do irmão mais desamparado.

Hoje, quando lhes cruzo os caminhos, edifico-me na contemplação do porte tranquilo e feliz dessas criaturas! Realizando uma nobilíssima missão, os seguidores e seguidoras de São Francisco são eloquentes à juventude e, tenho certeza, a muitos vão atraindo a uma vida digna, não necessariamente, no rigor do Instituto Filhos e Filhas da Pobreza e do Santíssimo Sacramento, a chamada Fraternidade da Toca de Assis. Não somente aos mais jovens, mas, em todos nós, os fradinhos e freirinhas da Toca provocam certa inquietação diante dos valores perenes, que, nem sempre, constituem o norte de nossos caminhos. Admirar a Toca de Assis é um bom começo; apoiá-la, no que for possível, é participar do bonito trabalho que, sem vaidades e no silêncio, a simpática irmandade vai realizando!
*Plínio de Campos Whitaker é professor aposentado da PUC-Campinas.
FONTE: http://cpopular.cosmo.uol.com.br/mostra_noticia.asp?noticia=1662628&area=2190&authent=3CEAD5DDA173320478ED4F99E10A96

2 comentários:

  1. Parabéns!!!
    Esse é um dos melhores textos sobre a Toca de Assis, que já li! Continue postando os textos do professor Whitaker.

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  2. Olá, gostaria de que o Plínio fizesse contato comigo: marcelobrunorodrigues@gmail.com. Fui colega de mesmos últimos anos - 2º grau - de sua filha Fátima.

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