quarta-feira, 1 de abril de 2009

O estresse faz bem

Passar nervoso de vez em quando
nos torna pessoas mais atentas,
ágeis e competitivas,
de acordo com o americano
BRUCE McEWEN*.

SUPER – O estresse costuma ser encarado como vilão. Por que você defende a tese de que ele faz bem?
McEwen – Porque o estresse representa um sinal de que estamos saudáveis. Ele é uma carga de ansiedade que todos recebemos para evoluir na vida. E estamos falando de situações que vão desde trazer comida para alimentar a família até conseguir um cargo mais alto na empresa.

SUPER – Como assim?
McEwen – Ficamos estressados sempre que nos sentimos ameaçados, como em situações de perigo ou de desafio. A resposta do cérebro a esse estado é uma dose de preocupação e agitação, que nos ajuda a resolver as tarefas em que estamos focados. Ou seja, ficamos mais competitivos e alertas. A chave desse processo é o cortisol, conhecido como hormônio do estresse liberado pelo cérebro em situações de pressão. Como o cortisol está relacionado ao hipocampo, uma parte do cérebro importante para a memória e para o aprendizado, sabemos que o disparo desse hormônio faz com que fiquemos mais vigiliantes.

SUPER – Como sentimos essa reação no dia a dia?
McEwen – Por meio das respostas que o cérebro ativa quando detecta uma situação de estresse: ansiedade, coração acelerado, liberação de adrenalina, aumento das funções da memória. São recursos do corpo que nos ajudam a identificar um perigo. Na vida moderna, essa ameaça pode ser uma briga com o namorado ou o esforço para cumprir os prazos impostos pelo chefe no trabalho. É por isso que sabemos que o estresse existe – e aqui está a boa notícia – para auxiliar a nossa sobrevivência, e não para nos matar, como muita gente acredita.

SUPER – Mas a resposta do corpo não parece nada positiva quando nos estressamos. Será que os benefícios do estresse não ficam só na teoria?
McEwen – Há críticos que dizem isso. Mas não há dúvida de que os mecanismos que causam o estresse existem para nos proteger e nos manter vivos. Também não há dúvida de que esses mesmos mecanismos, quando desregulados, causam doenças comuns nos dias de hoje, como depressão, obesidade, diabetes, artrite. O que falta no discurso dos críticos é dizer que o problema está em como o corpo reage a situações estressantes – uma resposta exagerada pode nos levar à exaustão e exigir uma reposição das nossas energias.

SUPER – Então você acha que o estresse pode, sim, passar de mocinho a bandido?
McEwen – Sim. Há três níveis de estresse: o bom, o tolerável e o tóxico. No nível extremo de estresse, as células do hipocampo perdem conexões com outras áreas do cérebro e se encolhem. Isso prejudica, por exemplo, o armazenamento da memória. Por isso sentimos que ficamos meio estúpidos quando passamos por muito estresse. É como se o cérebro parasse de funcionar e não processasse mais informação. Não há dúvida sobre os malefícios do estresse quando esse ponto é atingido. Entretanto, se o nível de cortisol no organismo funciona como deve, o cérebro é capaz de processar as respostas ao estresse.

(...)

SUPER – E como nos mantemos sob o estresse bom?
McEwen – Viver em um turbilhão de situações estressantes nos põe sob um estado de alerta constante, que leva o corpo ao desgaste e desencadeia doenças. Portanto, valem conselhos antigos: ter um estilo de vida saudável, alimentação balanceada, fazer exercícios físicos, dormir bem, não exagerar no consumo de álcool, não fumar, ter boas relações com as pessoas. Se o corpo funciona bem, viveremos sob o bom estresse. Discutir os problemas também pode ajudar. Já reparou como falamos sobre o estresse como se estivéssemos falando do clima? Virou uma forma de quebrar o gelo e começar uma conversa com um desconhecido. Esse desabafo pode ser o primeiro passo para aliviar as sensações de estresse.

(...)

SUPER – É possível nos livrarmos do estresse?
McEwen – Sempre sentimos e sentiremos o estresse de alguma forma. E, quando mais organizada e complexa for uma sociedade, mais o estresse tóxico aparecerá. O motivo é que as ameaças em uma sociedade complexa são mais numerosas e sutis do que em uma sociedade de organização mais simples. Não existe um grande predador – como a falta de comida -, e sim diversas ameaças, que podem ser a competitividade no trabalho ou a performance em um encontro romântico. E nem sempre conseguimos descansar depois de uma situação estressante, o que prejudica a recuperação do corpo e nos expõe ao pior tipo de estresse.

*Bruce McEwen, neurocientista e professor da Universidade Rockefeller, em Nova York. Autor do livro O Fim do Estresse Como Nós o Conhecemos.

Reportagem de Cristina Westphal. Revista Superinteressante/abril, 2009, pp.19/21.

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