segunda-feira, 21 de maio de 2007

GILLES LIPOVETSKY A sociedade da decepção

A sociedade da decepção.

Entrevista com Gilles Lipovetsky
21/05/2007

Na juventude, Gilles Lipovetsky militou num grupo pós-trotskista, mas nunca foi exatamente um comunista. Ele já escreveu sobre o luxo e virou consultor de grifes famosas, mas tampouco é um consumista. Redige seus livros à mão, em folhas de papel, nas mesas de hotéis, enquanto roda o mundo apresentando idéias tão acessíveis quanto polêmicas. Seu mais novo libelo se chama A sociedade da decepção (Ed. Manole), com lançamento marcado para segunda-feira 21, em São Paulo.
Nesta quarta-feira, dia 23, Lipovetsky estará na UNISINOS participando do
Simpósio Internacional O Futuro da Autonomia. Uma sociedade de indivíduos?

Ele foi entrevistado por Luciano Suassuna da revista IstoÉ, 23-05-2007.

Eis a entrevista.

O que é a sociedade da decepção?
A decepção é uma experiência humana universal desde sempre. Nas sociedades antigas, ela era restrita. Primeiro porque o desejo era mais limitado, existia uma cultura da resignação, resumida na expressão “é a vida”. E, depois, havia a religião, que limitava a decepção.
E quando ocorreu essa mudança?
A sociedade moderna fez explodir o sentimento da decepção. A democracia abriu o desejo das pessoas. Ela cria frustrações porque não suporta a desigualdade. E a era hipermoderna, que vivemos hoje, acelerou mais ainda a decepção, que agora está em todos os lugares, em todos os níveis sociais.

Primordialmente onde?
Na política, por exemplo. As pessoas, em todos os países, estão sempre decepcionadas com a política. Com a globalização, não há mais a esperança revolucionária. É a era do direito do homem, e este é sempre inferior ao desejo.

Quais outras fontes de decepção?
A escola. Antes ela tinha a virtude de permitir a ascensão social. Mas hoje temos jovens muito qualificados que trabalham em coisas que não correspondem a essa qualificação – e isso gera decepção.

Mas vive-se bem melhor do que no passado.
Vive-se globalmente melhor. As pessoas podem até se declarar felizes, mas isso não significa grande coisa. Há outros indicadores como a ansiedade no trabalho e com os filhos, taxas de suicídio e casos de depressão e dependência, que mostram como a sociedade de bem-estar é uma sociedade de frustrações.

De que maneira essas frustrações estão ligadas ao consumo?
Depois dos anos 60, desenvolveu- se a idéia de que o consumismo cria a decepção porque mostra o que você não vai ter. Ou que você seria forçosamente frustrado porque, quando tem uma coisa, já sonha com outra, como se isso levasse a pessoa a uma decepção permanente.

Por que isso não é verdade?
O consumo de bens materiais não é tão produtor de decepções. Os objetos têm um valor pela novidade. Não é porque você não tem um Jaguar que o seu carro modesto não o satisfaz. Você pode gostar da sua casa, sem que ela seja um castelo.

Então qual o consumo que leva à decepção?
O consumo cultural é o que decepciona. Veja, por exemplo, a televisão. Ela é feita para ser um espetáculo, mas se você fica zapeando é porque o espetáculo não o satisfaz. O zapping é uma permanente decepção.

E no campo das relações humanas?
A decepção mais forte, mais intensa, a mais cruel é a que você tem com outras pessoas. Então se engana quem culpa o consumo pela infelicidade. O que dá frustração é a individualização do mundo, é a relação com os outros e consigo mesmo.

Vivemos então um modelo fracassado?
Evito o pessimismo. A sociedade da decepção não é a da paralisia ou da depressão. As pessoas hoje têm mais iniciativa, existem mais associações, mais artistas. É uma sociedade que relança a vida, que permite um recomeço. Hoje podemos ter múltiplas vidas.

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